quarta-feira, 4 de outubro de 2017

CRADLE OF FILTH - Cryptoriana: The Seductiveness of Decay (Álbum)


2017
Nacional

Nota: 10,0/10,0

Tracklist:

1. Exquisite Torments Await...
2. Heartbreak and Seance
3. Achingly Beautiful
4. Wester Vespertine
5. The Seductiveness of Decay
6. Vengeful Spirit
7. You Will Know the Lion by His Claw
8. Death and the Maiden
9. The Night at Catafalque Manor
10. Alisson Hell


Banda:


Dani Filth - Vocais
Rich Shaw - Guitarras
Ashok - Guitarras
Lindsay Schoolcraft - Vocais femininos
Daniel Firth - Baixo
Marthus - Bateria, teclados, orquestrações

Convidados:

Liv Kristine - Vocais em "Vengeful Spirit"
Linda Nepivodova - Corais
Lucie Korinkova - Corais
Petr “Pete” Janovský - Corais
Vit Starka - Corais
Milos Makovsky - Corais
Martin Franze - Corais
Dana Toncrova - Corais
Ivan Nepivoda - Corais
Jakub Herzan - Corais


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Texto: Marcos “Big Daddy” Garcia


Os anos vão se passando e algumas bandas vão evoluindo, mostrando trabalhos cada vez melhores (outras nem tanto). Mas sempre é interessante observar como alguns nomes fortes vão se transformando e nos oferecendo discos que realmente são capazes de nos seduzir. E é um prazer enorme ouvir trabalhos de um dos maiores nomes do Metal extremo atual, o sexteto inglês CRADLE OF FILTH. Depois de dois anos após o ótimo “Hammer of the Witches”, eis que eles voltam com o excelente “Cryptoriana: The Seductiveness of Decay”, lançado no Brasil pela Shinigami Records e a Nuclear Blast Brasil.

A verdade é que o sexteto ostenta uma identidade musical única, e esta causou as famosas oscilações de qualidade em termos de álbuns. Mas como este é o segundo da sequência com a atual formação, vemos que a banda mostra um trabalho ainda mais conciso que em “Hammer of the Witches”, onde se percebe o uso de toda uma expressividade musical diferenciada, presença de cantos gregorianos adaptados ao estilo da banda, riffs cortantes e solos melodiosos, base rítmica bem trabalhada e com peso, belas passagens de teclados, e os vocais continuam com aqueles timbres agudos peculiares entremeados por urros guturais e narrativas decadentes. Na realidade, o sexteto recorre aos elementos de seus últimos discos, mas buscando a força musical de seu passado, de discos como a trinca de ouro “Dusk and Her Embrace”, “Cruelty and the Beast” e “Midian” (onde o estilo dele ganhou mais agressividade), mas usando de muitas partes orquestrais e operísticas na ambientação densa, elegante e soturna do disco.

Com “Cryptoriana: The Seductiveness of Decay”, o CRADLE OF FILTH nos dá mais uma obra-prima do Metal extremo, já que o Black Metal é pequeno para definir o trabalho do grupo em termos sonoros.

Assim como em “Hammer of the Witches”, a produção de “Cryptoriana: The Seductiveness of Decay” é de Scott Atkins (que ainda fez a gravação, mixagem e masterização do álbum), resultando em uma qualidade sonora limpa e bem feita, cuidando para aquela crueza e sujeira tão essenciais à banda fossem inseridas. O CRADLE OF FILTH nunca buscou por qualidades sonoras grandiosas ou limpas demais porque isso descaracterizaria sua identidade sonora, e mais uma vez, acertaram em cheio na escolha, especialmente porque os timbres dos instrumentos estão permitindo que as melodias sombrias das canções fluam sem problemas. Além disso, o baterista Marthus ainda ajudou na questão de escrever as partes dos corais e sopranos, partes que foram gravadas tendo Roman Jež e Igor Mores na engenharia sonora.

Se na parte sonora a banda repetiu o produtor, na gráfica ocorre o mesmo. Mais uma vez, o artista Arthur Berzinsh criou uma arte sinistra e chamativa, uma versão sombria da pintura “O Nascimento de Vênus”, de Sandro Botticelli, pintor italiano do Renascimento. Ela foi adaptada ao contexto lírico sombrio do disco, e por isso, ficou excelente.

Uma vez mais, o sexteto inglês mergulhou profundamente em uma concepção estética/lírica densa, enchendo as letras com elementos poéticos/góticos da era Vitoriana, com aquela obsessão pela morte, o sobrenatural e o fúnebre que se percebe em livros como “O Castelo de Otranto” e Os Mistérios de Udolfo", e o sufixo “A Sedução da Decadência” reforça a atração dos autores góticos pela morte e o processo de autodestruição, bem como pela decadência post-mortem.

Um tema tão complexo exige que o grupo faça algo musicalmente diferenciado, mas quando se trata de CRADLE OF FILTH, é algo natural desafiar padrões e estabelecer novas regras. Por isso são tão odiados pelos mais conservadores, amados pelos por aqueles que ouvem música sem pensar em padrões, e uma ameaça declarada ao preconceito contra as artes degeneradas. Por isso, a banda é minimalista em termos de arranjos, com uma ótima técnica instrumental, os vocais estão em tons um pouco mais baixos que o de costuma (mas muito mais interpretativos que antes), e tudo preparado de forma que o grupo funcione como uma máquina de guerra perfeitamente ajustada.

A música do sexteto sempre foi baseada no contraste entre a agressividade e a beleza soturna de suas melodias, logo, é um disco muito difícil de ficar buscando por melhores momentos. A extrema e curta “Exquisite Torments Await...” é tem a estética de uma introdução à lá “Ebony Dressed for Sunset” de “V Empire”, que precede a extraordinária “Heartbreak and Séance”, onde a banda esbanja mudanças de ritmo ótimas, sem contar de Rich e Ashok nas guitarras (tanto riffs como solos) é maravilhoso, e adicionem a isso a riqueza de timbres de Dani e aos corais climáticos (fora um refrão marcante). Logo, a agressividade domina nossos ouvidos com a chegada de “Achingly Beautiful”, com uma pegada que mixa Black Metal com algo de Thrash e Death Metal, mais mudanças de tempo e um trabalho perfeito de Daniel e Marthus na base, e sem mencionar os belos vocais femininos de Lindsay (especialmente nas partes mais lentas, melodiosas e atmosféricas), mesmos elementos e características apresentados na violenta “Wester Vespertine”, onde a interpretação de Dani é ótima. Teclados sinistros e guitarras melodiosas iniciam “The Seductiveness of Decay”, outra que vem cheia de energia bruta, mas cujas melodias começam a surgir das guitarras, mas se preparem para ritmos que mudam sem aviso. Em “Vengeful Spirit”, a maciez aveludada da banda contrasta com muita agressividade mais seca, e lindas melodias vão surgindo nos momentos em que a convidada especial, Liv Kristine, dá aquele toque de beleza, especialmente nos duetos com Dani e nas partes com vozes operísticas. Como se fosse um IRON MAIDEN do Metal extremo, o sexteto mostra guitarras de primeira em “You Will Know the Lion by His Claw”, que vem de uma citação de Johann Bernoulli sobre uma carta anônima (enviada por Isaac Newton) resolvendo um problema proposto (qual a trajetória que mais rápida entre dois pontos), e a solução é uma curva que chamamos de Braquistócrona (mesmo com a carta anônima, Bernoulli reconhecera que era Newton, por isso disse que “reconhecia o leão pelas marcas de suas garras”); e a música é cheia de floreios melódicos das guitarras (que solos!), fora uma estética baseada na mudança de ritmos. E “Death and the Maiden” fecha o disco de forma grandiosa, cheia de arranjos fúnebres de teclados, tempos mais lentos soberbos onde o baixo e a bateria mostram sua força, sem falar que o enfoque mais agressivo dos vocais é perfeito. Mas a versão brasileira tem mais: duas canções extras, que são a melodiosa e intensa “The Night at Catafalque Manor”, cuja estética relembra um pouco o que se ouve em “Dusk and Her Embrace” (especialmente pelo trabalho das guitarras e insanidade da base rítmica); e uma versão destruidora para “Alisson Hell”, do ANNIHILATOR, que ficou ótima, inclusive apresentando alguns teclados, e baixo e bateria estão perfeitos (falar das guitarras é chover no molhado, e a interpretação dos vocais é ótima, sem contar nos vocais femininos na parte que antecede os solos), ou seja, mais um grande clássico do Metal ganha vida nova nas mãos da banda.

Ame ou odeie, o CRADLE OF FILTH criou mais um disco que vem forte para ser um dos melhores do ano. E como “Cryptoriana: The Seductiveness of Decay” é envolto em toda uma concepção artística degenerada (e mesmo repleta de erotismo), esperamos que ele sirva para abrir os olhos dos macarthistas do Metal que andam apoiando a idéia de censurar as artes... 



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